Imagine-se, entusiasta do ciclismo, consumindo conteúdos para iniciar nesse universo, assistindo vídeo da Renata Falzoni no Youtube e, dentro da sua realidade, começando a difundir o ciclismo para amigos, parentes e até para aquele cara que sentou ao seu lado no ônibus, mas que você nunca tinha visto na vida. Então, o ciclismo entrou na minha vida cerca de 12 anos atrás, e eu, que antes era um assíduo “jogador” de futebol de campo sintético, comecei ali a abandonar o esporte das canelas roxas e a me concentrar nessa modalidade que, muito além das pancadas, nos entrega resiliência, persistência, planejamento, calma, força e, por que não, fé.
Quando comecei a pedalar, meu filho mais novo tinha apenas 7 anos de idade. Em certo momento, por volta dos 10 anos, ele entrou naquela fase de preocupação, ligava a cada 5 minutos enquanto eu estava nas trilhas, o que me deixava preocupado, imaginando o que se passava na cabeça dele. Afinal, vencer a resistência da família que estava acostumada a ter a pessoa em casa todos os sábados e domingos não é a missão mais simples do mundo. As pessoas ao redor nem sempre estão preparadas para aceitar que agora você é um ser do mundo, que está livre, que aprendeu que com apenas 2 rodas pode ir tão distante, até quando as pernas aguentarem. Se um adulto pensa assim, imagine uma criança? Então, diante disso, eu teria que desenvolver alguma forma de fazer meu filho aceitar aquela situação.
Como sabemos, o “vício da bike” começa com doses pequenas de serotonina. Você dá aquela volta no parque com uma bicicleta comum, depois um amigo te chama para um pedal noturno, com doses mais fortes de adrenalina e sociabilidade, 50, 100 pessoas fantasiadas de atletas, com capacete, short apertado, luvas e até sapatilhas. Elas saem do seu trabalho, se arrumam e se dirigem ao ponto de saída. Esses grupos reúnem pessoas de todos os tipos, com vidas, idades e profissões diferentes, e é incrível como elas, ali juntas, começam a falar sobre um único assunto. Bicicleta. “Aro 26 vs 29”, “10, 11, ou 12 velocidades”, “1, 2 ou 3 coroas”, “Carbono ou alumínio”, “MTB VS Speed”… De repente, somos abduzidos por esse universo.
“Se não pode vencê-los, junte-se a eles.”
Como todo medo existente, a melhor maneira de eliminar essas visões negativas sobre a realidade é apresentar a vida como ela é, ou seja, vivenciar aquilo que nos causa medo. Quando comecei a fazer trilhas mais difíceis e até cicloviagens, minha estratégia foi trazer a família para perto de mim. Como? O primeiro passo é transformar o que seria um simples pedal em uma pequena aventura. Um evento tradicional no Centro-Oeste é o Superando Limites, uma cicloviagem de Santo Antônio do Descoberto até Pirenópolis. Quando me desafiei a encarar essa trilha, minha primeira ideia foi unir o útil ao agradável. Preparei tudo para que minha família pudesse me esperar na cidade de Pirenópolis, para que eles pudessem ver que não tinha apenas um louco em casa, que existiam milhares de loucos. E foi assim que as coisas começaram a melhorar.
Com essa leve introdução de realidade, qual seria a próxima etapa? Trazer meu filho para o mundo da bike. Meu filho sempre pedalou, desde pequeno eu já o levava para girar no parque, mas depois que passei a me dedicar ao ciclismo e a ficar distante nos finais de semana fazendo trilhas mais pesadas, passamos a pedalar menos juntos. Foi então que eu o inseri no mundo do MTB. Como todo bom brasiliense, iniciar no mundo do MTB passa quase que necessariamente por pedalar com o grupo Rebas do Cerrado. E assim começou, comprei aquela bike de entrada, ele foi pegando amor pela brincadeira até que começou a participar de competições na região e até vencer algumas delas! E eu, que antes era o ciclista da família, comecei a acompanhá-lo nas provas.
Mas a evangelização não pode parar
Agora estava tudo certo, ou quase tudo. No ano de 2016, decidi ir ao Iron Biker, aquele evento de MTB que acontece em Mariana-MG e dispensa apresentações. Saindo de Brasília, é uma viagem longa de carro, cerca de 850km, e eu iria precisar de um apoio para dirigir. Bem, tudo preparado para ir, e eu convido meu pai para me dar esse apoio. Ele, com seus quase 55 anos na época e já tendo passado por um infarto e cirurgia cardíaca, estava em uma fase de pouca prática de atividade física regular. Como todo bom ciclista evangelizador, resolvi levá-lo para a meca do ciclismo. As pessoas que não participam dessas atividades não imaginam e não acreditam no tamanho e na força dessas comunidades. Meu pai era um deles; ele simplesmente levou um susto quando viu uma cidade inteira parada em função das duas rodas. Foi ali que ele foi pego. Poucos meses depois, ele se tornaria mais um ciclista da família.
Conclusão:
A jornada do ciclismo é como uma estrada repleta de desafios e descobertas, onde cada pedalada nos leva não apenas a novos lugares, mas a novas conexões e aprendizados. Transformar uma paixão em algo que une gerações e inspira mudanças é uma prova de como o esporte vai muito além do físico: ele é uma força que transforma vidas.
O que começou como uma simples curiosidade, influenciada por vídeos e pedaladas esporádicas, se tornou uma missão de evangelização. Não apenas para amigos e desconhecidos, mas também para aqueles que estão mais próximos de nós. Seja ao conquistar o coração de um filho com trilhas emocionantes ou ao apresentar a magia do ciclismo para um pai desacreditado, cada momento reflete o poder de criar laços através das duas rodas.
No final, o ciclismo não é apenas um esporte; é um estilo de vida que ensina resiliência, união e, acima de tudo, a alegria de seguir adiante – sempre com fé, força e a certeza de que há novos horizontes para explorar. Afinal, como bem sabemos, no universo do ciclismo, a jornada é tão importante quanto o destino. 🚴♂️