Provavelmente você conhece alguém que fez low carb – ou então você é a pessoa que fez low carb. Qualquer uma das variantes de dieta que restringe ou praticamente elimina os carboidratos têm muitos seguidores: cetogênica, low carb, Atkins, paleo, Whole30… Mas se você pratica esportes, existem bons motivos para você não cortar carboidratos.
Ok, você não precisa afundar sua cara em pizza e macarrão antes de cada prova ou longão. E também não estamos dizendo que ajustar os carboidratos não funciona para perder peso. Inclusive existem muitos atletas com acompanhamento profissional que seguem dietas de baixo teor de carboidrato e usam suas reservas de gordura para treinar.
Nosso ponto é que se você aprender a comer carboidratos na medida certa e escolher boas fontes, vai ajudar seu corpo a ter a melhor performance possível. “O carboidrato tem como função a produção de energia. Sua demonização não tem sentido para o praticante de atividade física, já que ele é o combustível preferencial da célula muscular em determinados tipos de exercício”, explica Carlos Eduardo das Neves, coordenador da pós-graduação em Nutrição e Suplementação Esportiva da Universidade Veiga de Almeida (UVA).
Além disso, o cérebro também usa carboidratos como fonte primária de energia. Ao cortar carboidratos, o corpo começa a produzir energia a partir de outras fontes. Para o atleta, essa fonte pode ser a gordura, mas também a massa muscular. Ou seja, quando se reduz a ingestão de carboidrato, o corpo do praticante de atividade física passa a viver de gliconeogênese: transforma o que não é glicose em glicose. “Nesta situação, a proteína muscular poderá servir de fonte metabólica, a longo prazo, o que pode resultar em uma diminuição drástica da massa magra, com impactos na composição corporal e performance do atleta”, alerta o nutricionista. Ou seja, se perder massa magra, não tanto a pena assim cortar carboidratos.
Carboidratos queimam gordura
“A gordura queima em uma chama de carboidrato”, diz Carlos, citando uma frase famosa no meio da Fisiologia do Exercício. “Para que a gordura corporal seja metabolizada, é necessária a presença de carboidrato. Portanto, para o processo metabólico aeróbio ter sua plena funcionalidade e haver a perda de gordura, é necessário ter sempre este aporte de carboidrato, principalmente, de glicose”, explica Carlos. Ou seja, ainda que a ausência de carboidrato não leve à paralisação do Ciclo de Krebs, a presença dele o potencializa.
Se você não tem carboidrato armazenado no corpo na forma de glicogênio intramuscular, seu corpo pode buscar essa energia nos seus músculos. E assim você perde massa magra antes de queimar massa gorda. A melhor forma de criar esse estoque de glicogênio nos músculos é justamente consumir carboidratos.
Carboidrato ajuda na contração muscular
Para que haja contração muscular, é preciso haver produção de energia, que pode vir do carboidrato. A contração, de acordo com a intensidade e duração, terá combustíveis diferentes. “Um exercício de explosão – alta intensidade e curta duração – utiliza basicamente o ATP-CP (ATP, moeda de energia, com a creatina-fosfato)”, explica Carlos.
Mas em atividades de menor intensidade e maior duração, entra em cena o sistema anaeróbio lático, que usa o glicogênio muscular e a glicose como fontes de energia. “Quando há aumento no tempo de contração e redução da intensidade, é possível utilizar gorduras, aminoácidos e carboidratos como fonte de energia. Portanto, em ambos os casos – metabolismo feito na presença do oxigênio (aeróbio) ou na ausência (anaeróbio) –, pode haver a presença do carboidrato como fonte de energia para a contração muscular”, explica o nutricionista.
Além disso, o glicogênio que fica dentro dos músculos também regula a função do cálcio muscular, necessária para a contração muscular. Se os níveis de glicose e glicogênio diminuem, a força que você consegue fazer também.
A perda de peso é temporária
A perda de peso é rápida ao cortar carboidratos, mas os primeiros quilos que vão embora são apenas água. Cada grama de carboidratos permite ao corpo armazenar 3 a 4 gramas de água. Ao cortar os carbos, o corpo expulsa a água dos músculos e do fígado.
Com o tempo, você acaba perdendo também gordura e massa muscular. O problema é que cortar carboidratos para sempre é bastante difícil. Além disso, pode causar um efeito de rebote em dias de alimentação livre, fazendo você comendo carbo descontroladamente. A maioria das pessoas acaba engordando tudo de novo e até mais do que antes.
Vegetais não suprem os carbos necessários
Não tente se enganar dizendo que vegetais como vagem, brócolis e abóbora contém carboidrato, portanto você já come o suficiente. Você deve sim comer muitos vegetais porque eles são fonte de fibras e micronutrientes importantíssimos, mas eles não conseguem dar energia suficiente para seu corpo.
Para ter os benefícios, você precisa colocar alimentos que sejam fonte de carboidratos no prato: pão, aveia, macarrão, batata, quinoa, arroz. O segredo é o ajuste de quantidades: você pode continuar comendo um mundo de vegetais, e acompanhando seu prato de uma fatia de pão ou uma batata pequena.
Cortar carboidratos é cortar combustível
A quantidade de carboidratos necessária depende do seu nível de atividade física. Se você está correndo ou pedalando muito, você precisa ajustar seu consumo de carboidrato para não ter perdas no rendimento e até lesões. A Sociedade Brasileira de Medicina Esportiva recomenda que de 60% a 70% das calorias ingeridas pelo atleta devem vir dos carboidratos.
“Para melhorar a recuperação muscular, a ingestão de carboidratos deve estar entre 5 e 8g/kg de peso/dia, podendo chegar até 10g/kg de peso/dia em atividades de longa duração”, explica Carlos. Cada grama de carboidrato fornece quatro calorias de energia.
Foque nos menos processados e integrais quando não estiver treinando. “Mas tudo depende do objetivo de cada pessoa. Basicamente, os carboidratos refinados – açúcar refinado, massas e pães feitos com farinha branca, por exemplo – são úteis para uma rápida reposição energética”, explica o nutricionista. Então, até a ingestão de carboidratos com alto índice glicêmico pode favorecer a produção de glicogênio e retardar fadiga. Em um longão, por exemplo, eles dão energia imediata e evitam problemas digestivos por excesso de fibras.
Se o objetivo for aumentar massa muscular, os refinados poderão ser consumidos – logicamente, dentro de um planejamento nutricional e em porções adequadas. Por outro lado, caso o intuito seja diminuir a quantidade de gordura, os carboidratos refinados, com alto índice glicêmico, devem ser evitados e dar lugar a carboidratos integrais. Boas opções são aveia, pães e massa de farinha de trigo integral, raízes como batata doce, batata inglesa (se possível com a casca) e mandioca, frutas, grão-de-bico, milho, tapioca.
E vale sempre o bom senso: no fim de um pedal longo e pesado, tudo bem preferir um pedaço de bolo de chocolate em vez de uma tigela de quinoa. Ou caprichar na granola do açaí. É só saber separar os momentos certos para estas pequenas indulgências.
Por Verônica Mambrini